segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Em época de Natal

Lizete Baessa
Resolvi fazer uma pequena homenagem a uma senhora que faz o bem durante o ano inteiro, pondo em prática aquele velho ditado: "O Natal é quando um homem quiser". Uma homenagem a uma grande mulher que faz com que seja Natal todo o ano para as crianças que acolhe na sua pequena casa no bairro de Chelas, em Lisboa.
Bairro de Chelas
Os lisboetas conhecem Chelas, mas para quem não sabe, basta dizer que é um bairro com alguns problemas sociais. Um bairro social criado para realojar os habitantes do antigo bairro do Relógio. Como muitos bairros sociais é um bairro isolado do resto da cidade, fazendo lembrar um verdadeiro guetto. Este isolamento não ajuda à inserção na sociedade, no mercado de trabalho, etc., e formam-se assim famílias problemáticas, perdidas num ciclo vicioso de desemprego e violência, cujas crianças crescem ao abandono pelas ruas, sem o acompanhamento que todas as crianças devem ter. Para não me baterem, vou esclarecer que estou a fazer uma generalização, é claro que existem famílias funcionais e bons trabalhadores em Chelas, como em qualquer bairro deste mundo.

Lizete Baessa, a senhora em questão, via muito bem os problemas à sua volta: " Via-os por aí na rua, fazia-me confusão estarem ali todo o dia. A escola é de vez em quando. É o estragar, o partir, o tratar mal." E resolveu fazer alguma coisa. Começou a acolher crianças (o nº varia entre 10 a 20 meninos) durante o dia ou depois da escola, começou a dar educação, a impôr regras, a encaminhar, a dar amor e eles receberam tudo de braços abertos. "Aqui encontram calor, amor." A tia preta, como é chamada carinhosamente por todos, mostra-lhes que existe um mundo fora do bairro e também que é possível ser diferente. Hugo, de 17 anos, um dos rapazes que frequenta a casa de Lizete há mais tempo, diz: "A tia preta é como uma mãe para mim. Não imagino a minha vida sem ela. Antes, eu era um miúdo que só fazia disparates. Cheguei até a roubar. Não ligava à escola, só queria estragar coisas, falar mal, discutir. Agora sou outra pessoa."
E Lizete diz: "É tão bom vê-los mudar."
Nota: As informações contidas neste post e a foto de Lizete Baessa foram retiradas duma reportagem do Diário de Notícias de sábado, dia13 de Dezembro. A reportagem era de autoria de Fernanda Câncio e a fotografia da autoria de Orlando Almeida.

10 comentários:

Inside me disse...

Não nos definimos pelo que só fazemos uma vez mas sim pelo que fazemos constantemente...

...ainda bem que existem pessoas assim, que fazem de cada dia um dia de natal...

... infelizmente só são lembradas nestas epocas... mas nunca serão esquecidas pelos corações que aquece...

Unknown disse...

Só é pena não existirem mais destes actos isolados.
As instituições que deveriam fazer este trabalho, têm poucos apoios e estão cheias de burocracias, é sempre de louvar estas iniciativas...
Beijo

Inside me disse...

...A posição da mão da menina na sua cara... diz tudo...

...ainda bem que encontraste.

Obrigado.

Claudia disse...

Os problemas do bairro Chelas não são exclusivos de lá, não é verdade? Parece que as autoridade nunca aprendem que isolamento em 'bairros sociais' não ajuda. Mas a indiferença ao sofrimento alheio é o pior que pode acontecer e causa os maiores danos. E aí eu falo por experiência já que no Rio as favelas estão no meio da cidade e continuam um problema por conta da indiferença.

Mas os bons exemplos estão aí para serem lembrados e celebrados!

C.

ameixa seca disse...

O que falta neste país são as oportunidades. Muitos de nós continuam a sobreviver da bondade de quem tem pouco mas que, mesmo assim, dá. Não faltam milhões para injectar no traseiro dos gestores de bancos. Quem precisa de dinheiro, quem merece distinção, vive num bairro perdido no meio da grande cidade.
É injusto, indecente, incoerente!!!
E quem pode fazer algo faz ouvidos de mercador, cruza os braços e vai passar o Natal longe desta realidade.
Parabéns à senhora em questão e muito bom Natal a todos :)

Bergamo disse...

Isabel,
Obrigado pela visita lá no blog do Bergamo.
Sobre a sua pergunta, e pensando na palestra que assisti (sobre a formação da culinária brasileira), entendo que somos sim formados por essa miscigenação - europeus, índios e africanos - mas, segundo o palestrante, só isso não sustentaria a nossa cozinha, e devemos procurar no policentrismo sócio-cultural atual as nossas bases alimentares. Acredito que ele esteja correto...mas, vejo que não podemos esquecer o passado. Este teve sim um papel fundamental na nossa formação. Essa miscigenação também pode ser entendida como fusion cuisine...ocorrida há séculos aqui nos trópicos, muito antes da globalização (ou será que a globalização esteve presente em nossas vidas desde sempre?)
Abraços!!!
Bergamo

Cláudia Marques disse...

É uma bênção que haja pessoas assim, que dedicam a sua vida a melhorar a vida dos outros, a mostrar-lhes caminhos, a dar-lhes o que eles precisam, que é tão simples e ao mesmo tempo, para eles, tão difícil de obter.

«É tão bom vê-los mudar», diz ela.

É tão bom que estas pessoas existam.

Heloísa Sérvulo da Cunha disse...

Isabel,
Que trabalho maravilhoso !
Se existissem mais Lizetes, com certeza os problemas sociais seriam menores, principalmente aqueles vividos pelas crianças.
Beijos

Inside me disse...

Acabei de ver agora mesmo, bem ainda esta a dar, uma reportagem no canal 1 no jornal da tarde das 13h sobre esta grande senhora.

Agora a recuperar de um cancro... mas com uma vivacidade impressionante ... juntamente com os seus meninos de chelas que acolhe.

Obrigado.

e-Pombo disse...

Pessoas como a Lizete fazem falta em todo o lado. Eu moro no quarteirão ao lado desses cor-de-rosa da foto, e é verdade, muitas crianças desde pequenas que andam nas ruas e os pais não querem saber, é triste, mas como bairro social posso dizer que a nossa Junta tem feito muito para melhorar a qualidade de vida de todos. Lembro que à 13 anos atrás os meus pais não me deixavam andar na rua porque era muito perigoso, coisa que neste momento está completamente fora de contexto, é uma zona simpática onde os de fora podem passar sem problemas (nesta zona claro, excluindo zona M e zona J principalmente).
Em relação ao realojamento, alguns vieram para este bairro, mas a maioria dos habitantes não eram de todo do bairro do relógio, os prédios onde vivo por exemplo foram criados para os antigos trabalhadores do "Porto de Lisboa", sendo que a maioria das pessoas que moravam no dito bairro (conhecido também por Camboja) foram realojados no Casal dos Machados (junto a Moscavide).

PS: Fiquei curioso em relação a essa senhora, sabem dizer-me se mora mesmo nesses prédios cor-de-rosa? É que por vezes reuno roupas que vou dar a colégios... se forem necessárias poderei procurála!